Neste artigo derivamos as equações do movimento usadas no app Conservação de Energia Mecânica a partir do formalismo Lagrangeano da mecânica clássica.

Considere o movimento de uma partícula de massa m restrito a uma dada trajetória y=y(x). Sobre a partícula agem a força peso P e, em determinadas regiões do percurso, força de atrito Fat e força elástica Fel de uma mola, como mostrado na Fig. 1. Conhecidas as condições iniciais x(0)=x0 e v(0)=v0, mostraremos aqui como encontrar a posição e a velocidade em qualquer instante t>0.

Movimento de uma partícula em uma trajetória unidimensional
Figura 1. Movimento de uma partícula em uma trajetória unidimensional. Baseado no app Conservação de Energia Mecânica.

Consideraremos o formalismo lagrangeano da mecânica clássica, a maneira mais fácil de chegar nas equações do movimento. A energia cinética da partícula é dada por

T=m2(˙x2+˙y2).

Como o movimento está restrito a uma trajetória unidimensional, podemos eliminar a variável y considerando a restrição

y=y(x).

Nesse caso, a energia cinética fica dependendo apenas de x e de ˙x:

T=m˙x22[1+y(x)2].

A energia potencial U do sistema possui dois termos: energia potencial gravitacional e energia potencial elástica, de forma que escrevemos

U=mgy(x)+k(xxM+l0)22H(xxM+l0),

onde y(x) é a altura da partícula em relação a um dado referencial, H é a função degrau de Heaviside, xM é a posição da extremidade direita da mola, mantida fixa, e l0 é o seu comprimento no repouso. No app, l0=70 cm. H entra na equação (4) porque a força elástica começa a atuar no objeto apenas quando ele está em contato com mola, isto é, sempre que x>xMl0.

De posse das equações (3) e (4), chegamos no lagrangeano do sistema, ainda sem considerar a dissipação devido ao trabalho realizado pela força de atrito:

L=m˙x22[1+y(x)2]mgy(x)k(xxM+l0)22H(xxM+l0).

Agora partimos da equação de Euler-Lagrange,

Lxddt(L˙x)=0,

para deduzir as equações no movimento. Para o primeiro termo do lado esquerdo da equação (6), podemos escrever

Lx=m˙x2y(x)y(x)mgy(x)k|xxM+l0|H(xxM+l0).

Já para o segundo termo, o cálculo das derivadas parcial e total levam a

ddt(L˙x)=2m˙x2y(x)y(x)+m¨x[1+y(x)2].

Juntando as equações (7) e (8), chegamos na seguinte equação:

[1+y(x)2]¨x+y(x)y(x)˙x2+gy(x)+km|xxM+l0|H(xxM+l0)=0.

Essa equação possui dois termos não lineares, o que implica que, muito provavelmente, não deve haver uma solução exata para ela. E ainda falta incluir o efeito da dissipação por atrito.

Já esperando por uma solução numérica, vamos dividir essa EDO de segunda ordem em duas de primeira ordem. Considerando que ˙x=v e que ¨x=˙v, chegamos no sistema de EDOs abaixo:

˙x=v[1+y(x)2]˙v=y(x)y(x)v2gy(x)km|xxM+l0|H(xxM+l0).

A última etapa que falta fazer é incluir o efeito do atrito. No app, o coeficiente de atrito μc só existe na região plana central, centralizada em x=xa com largura de la. Sabemos que a força de atrito cinético é dada, em módulo, por

Fat=μcmg.

Assim, inserindo Fat/m no sistema (10), chegamos finalmente no conjunto de EDOs por trás do simulador Conservação de Energia Mecânica:

˙x=v[1+y(x)2]˙v=y(x)y(x)v2gy(x)km|xxM+l0|H(xxM+l0)μcgΠ(xxala)sign(v),

onde Π é a função retângulo, ou função Pi de Heaviside, definida por

Π(xa)={0, se|x|>a212 se|x|=a21 se|x|<a2.

Π aparece no sistema (12) para delimitar a dissipação por atrito dentro do intervalo xala/2<x<xa+la/2.

No aplicativo, o sistema de equações (12) é resolvido numericamente pelo método de Runge-Kutta de quarta ordem com passo de integração temporal 0,0035h (em unidades de segundos), onde h pode ser escolhido pelo usuário com valores possíveis entre 1 e 10. Isso deve levar a um erro numérico relativo a algo em torno de 0,025%.